Olhar Direto

Sábado, 18 de maio de 2024

Opinião

Os desafios para implantação da Lei de Igualdade Salarial e Critérios Remuneratórios

Autor: Carla Reita Faria Leal e Vitor Alexandre de Moraes

03 Mai 2024 - 08:00

Até a presente data existem desafios e controvérsias jurídicas para a efetivação da recente Lei n.º 14.611, de 3 de julho de 2023, que dispõe sobre a igualdade salarial e de critérios remuneratórios entre mulheres e homens para a realização de trabalho de igual valor ou no exercício da mesma função.
 
Esta lei representa avanço na legislação brasileira por instituir mecanismos de fiscalização e combate de práticas discriminatórias por meio da instituição de vários instrumentos, tais como: a implantação de Relatório de Transparência Salarial e de Critérios Remuneratórios e de Plano de Ação para Mitigação da Desigualdade Salarial e de Critérios Remuneratórios entre Mulheres e Homens; a criação de canais específicos para denúncias de discriminação salarial; a promoção e a implementação de programas de diversidade e inclusão no ambiente de trabalho; o fomento à capacitação e à formação de mulheres para o ingresso, a permanência e a ascensão no mercado de trabalho em igualdade de condições com os homens; e penalidades mais severas aos empregadores descumpridores da norma.
 
A regulamentação da lei da igualdade salarial ocorreu por meio do Decreto n.º 11.795/2023 e da Portaria n.º 3.714/2023, que determinaram a publicação semestral de relatórios de transparência salarial e dos critérios remuneratórios a ser elaborado pelo Ministério do Trabalho e Emprego, nos meses de março e setembro, com base nas informações prestadas no e-Social, pelas pessoas jurídicas de direito privado com 100 ou mais empregados.
 
O Relatório de Transparência Salarial e de Critérios Remuneratórios tem por finalidade a comparação objetiva entre salários, remunerações e a proporção de ocupação de cargos, devendo contemplar, no mínimo, as seguintes informações: o cargo ou a ocupação; e o valor do salário contratual; do décimo terceiro salário; das gratificações; das comissões; das horas extras; dos adicionais e das demais parcelas que, por força de lei ou norma coletiva de trabalho, componham a remuneração do trabalhador.
 
Desde a vigência da lei da igualdade salarial e de seu decreto regulamentador, empresas e entidades sindicais representantes do setor empresarial vêm se insurgindo contra suas disposições, ajuizando ações que visam a liberação de seu cumprimento.
 
No geral essas ações pretendem que o Poder Judiciário aprecie alguns pontos da Lei n.º 14.611/2023, retirando sua validade com diversos fundamentos. Atacam a divulgação dos relatórios com os valores dos salários sob a alegação de que isso poderia resultar na exposição de dados pessoais ou de estratégias e segredos de negócio, podendo causar dano reputacional à imagem das empresas, gerando violação à intimidade, à proteção de dados, à livre inciativa, à concorrência e à proporcionalidade.
 
Ademais, afirmam que desigualdades consideradas legítimas e objetivas, como o tempo na função e na empresa e a perfeição técnica do trabalho, não devem ser consideradas como discriminação por gênero, conforme previsto no § 6º do art. 461 da CLT, alterado pela nova redação da Lei, pois essa disposição violaria artigos da Constituição Federal que tratam da isonomia, daí o pedido de que seja declarada sua inconstitucionalidade.
 
Alegam também que deve ser aplicado o princípio da segurança jurídica para permitir a acumulação de pedido de dano moral apenas quando a discriminação tiver ocorrido com dolo do agente e não na mera presença de diferença salarial. Para além disso, que antes da imposição de qualquer penalidade, como a elaboração de Plano de Ação para a correção das diferenças, deve ser garantido à empresa fiscalizada o amplo direito à defesa. 
 
A União Federal, nas ações nas quais tem defendido a lei e os atos regulamentadores, dentre outros fundamentos, vem alegando que Plano de Mitigação é uma oportunidade para que a empresa corrija ou se justifique sobre as diferenças salariais encontradas e, finalmente, enfrente a discriminação estrutural. Tem sustentado que não há qualquer violação ao sigilo salarial com a divulgação do relatório, uma vez que, conforme Nota Técnica do Ministério do Trabalho e Emprego, não haverá divulgação dos salários dos empregados de uma empresa, mas tão somente a demonstração da diferença percentual dos valores pagos para mulheres e homens inseridos em cada um dos grandes grupos de classificação brasileira de ocupações (CBO), como foi discutido no Grupo Trabalho Interno do Plano Nacional, com a participação de várias confederações e federações patronais.
 
Entendemos que a Lei n.º 14.611/23 reflete o compromisso do texto constitucional em promover não apenas a igualdade formal, mas também a igualdade substancial, por meio de políticas públicas que buscam equilibrar as disparidades de tratamento por gênero existentes na sociedade, sendo poder-dever de o Estado promover um ambiente de justiça social e equidade, conforme a previsão antiquíssima da CLT.
 
Esperamos a sociedade se envolva nessa discussão, tendo um maior conhecimento acerca da lei da igualdade salarial e dos desafios e controvérsias jurídicas que a cercam, e também esperamos que brevemente tenhamos respostas através do julgamento da ação Direta de Inconstitucionalidade que foi remetida pelo seu relator, Ministro  Alexandre de Moraes, para o plenário, para análise diretamente do mérito, devida grande relevância da matéria constitucional e de seu especial significado para a ordem social e a segurança jurídica.
 
Carla Reita Faria Leal e Vitor Alexandre de Moraes são membros do Grupo de Pesquisa sobre Meio Ambiente do Trabalho da UFMT, o GPMAT.
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